29 de abr. de 2009

MAREMOTO




MAREMOTO


Empurrado por um eu mais depressivo
Calo os versos que não me deixam calar
Acomodo-os num soneto dispersivo
E remeto-os cá pro fundo do meu mar

Um profundo em que os eus que me confundem
Não desistem de tentar me recompor
Recompondo-se em ondas que me iludem
E ao quebrarem-se não quebram minha dor

Chegam à praia dos meus próprios pedregulhos
E desfilam aos meus olhos de Narciso
Refletindo meu semblante – minha foto

Depois voltam-se com um aparente orgulho
Me depondo os mesmos versos imprecisos
Decompostos neste falso maremoto

27 de abr. de 2009

UMA LINHA DE FRENTE DO CAOS


c a o s


Não é preciso ser nenhum expert para reconhecer que os movimentos literários de fôlego já não existem há décadas.
Desde o Modernismo e as vertentes de vanguarda experimentalista, que nos legaram o concretismo, o tropicalismo, o underground, etc., nossa literatura não se beneficia de nenhum grande movimento organizado. O que, na verdade, não tem sido nenhum empecilho maior ao florescimento de obras originais no sentido menos romântico do termo.
Afinal nestes tempos internáuticos até as idéias estéticas parecem-nos, naturalmente organizadas. Quaisquer informações atravessam os quatro cantos de maneira rápida e eficiente. E, em meio a isso, quem quer produzir literatura tem hoje um espaço nunca antes visto. Em que pesem a infinidade de postagens inteiramente descartáveis, as apropriações indevidas, as regras de um mercado impositivo desmotivador e aliciante, a via on-line mantém-se cada vez mais ampla e aberta a novos autores. Estão aí as páginas pessoais, blogs, sites de toda a sorte, a pavimentar novos e novos caminhos; a interação, a crescente intertextualidade, a retórica creative commons, a incontrolável liberdade de criação/recriação e os inúmeros produtos de valor inegável daí advindos.
Por que se falar então em movimento organizado? O mercado e as iniciativas independentes, embora muitas vezes em choque, têm dado conta de responder, natural e eficientemente, às exigências estéticas dos novos tempos. Nunca as artes visuais, a música e todo o pensamento estético da humanidade estiveram tão sintonizados com as aspirações da sociedade. Por mais que se prolifere o lixo comercial amparado pela mídia, barreiras são quebradas a todo instante. Culturas se entrecruzam e antropofagem, sinalizando para uma sociedade global muito mais próxima da utopia da arte auto-reflexiva e norteadora; capaz de reconsiderar e reconduzir o homem como ser social e intimista, num mundo “completo”, onde as injustiças, as políticas agressivas, a exploração e a fome (de comida e de inserção) não são mais simples segredos locais de ditas/Cias e democraduras.
Porém essa onda de aparente democratização da informação e do alcance dos ideais mais nobres tende a refletir e escamotear um grande caos na esfera das mentalidades e do próprio sistema produtivo. Quem não se reorganizar acabará sendo engolido implacavelmente pela hecatombe desenfreada do progresso dito pós-moderno.
Quanto ao sistema em si, depois das lições e deturpações do frustrado ideal de inspiração marxista, os mecanismos de readaptação e inserção da eficiente burguesia tendem a administrar e redirecionar o caos, para bem dos “sacro-santos” valores da iniciativa privada, por meio de um implacável movimento evolucionista de natureza e espécie fundadas numa apropriação meio que filosófica do mais tradicional espírito darwinista.
Mas, e as mentalidades, ou, mais propriamente, a atuação estética – sobretudo a literária?
Como fazê-la beneficiar-se desse rico e produtivo caos on-line?
Uma seleção natural, como a que muitos de nós e toda a elite dominante parecemos apostar, não tenderia a fazer prevalecer as iniciativas mais comerciais e menos socialmente pragmáticas?
Quero dizer, não caberia ao chamado artista virtual mais experiente e esclarecido, aquele cujo foco de atuação sugere um efetivo desenvolvimento das expressões artísticas como a dita literatura estilhaçada, assumir a linha de frente na construção de um movimento virtual e atrativamente organizado; um movimento tendente a abstrair desse caos de aparência irreversível uma nova estética, direcionada para as transformações que o mundo de hoje (real e literário) reclama?
Já se fala em virtualismo como uma espécie de vertente organizada do olhar pós-modernista no interior da web. Mas a grande maioria dos artistas e pensadores que se expressam nos inúmeros blogs, portais e sites literários que pululam pela rede não parece (ou não consegue) manifestar grande interesse numa efetiva iniciativa de organização – preocupados que estão em canalizar adeptos às suas legítimas aspirações a um mínimo reconhecimento público.
Contudo, será que em meio a todo esse caos cibernético não temos como reunir disponibilidade e quadros capazes de filtrar e redimensionar as inúmeras iniciativas culturais da web em mínimas associações de conteúdo e atuação por uma verdadeira alternativa, que tenda a apontar para o embrião de um efetivo movimento organizado?
Com a palavra os aspirantes a uma ação on-line conjunta, de cunho verdadeiramente transformador.

Abril/2009




22 de abr. de 2009

A PENA E O PÊNIS


A PENA E O PÊNIS
(um soneto pornográfico)


Porque minha pena de poeta ultrapassado
Ainda insiste em me exigir mais poesia;
Em revelar-me quase sempre ensimesmado,
E abusando da pior pornografia;

Porque este pênis cada dia mais caduco
Ainda acata as perversões da minha mente;
A me fazer um sonetista quase eunuco,
Insatisfeito com seus versos impotentes;

Faço sonetos como se fizesse amor;
Procurando, a cada gozo, um novo estímulo,
Um novo encontro com meu pênis de menino.

Pesco palavras com um anzol masturbador;
A cada verso uma enxadada e outra minhoca
– outra punheta ao estilo troca-troca.


3 de abr. de 2009

n a v e g a r p r e c i s o

Estive em férias off-line.
Naveguei, literalmente, pelos meus mares martírios.
Tudo real!
O tédio, a existência, a dor, o riso, a criança, o oceano, os sonhos, lembranças, idéias…
Curtas férias.
Curtidas como um cruzeiro – fermento!
Vida sem internet.
Internet sem vida.
Estive longe.
Volto ainda mais longe – curto!
E preciso…